domingo, 8 de abril de 2007

Pensar as instituições II

É relativamente unanime e consensual a ideia de que os pais estão cada vez mais necessitados de ajuda na dificil tarefa que a educação das crianças representa nos tempos que correm. Não por manifesta malvadez das crianças ou incompetência dos projenitores, mas por causa das circunstâncias que contribuem para que as crianças pareçam mais malvadas e os pais mais incompetentes.

Se 99,99% dos miudos não são efectivamente maus miudos e se, por outro lado, 99,99% dos pais não são de facto maus pais, como é que se entende este fenómeno crescente de indisciplina nas escolas e familias? Como se justifica que filhos ditem regras em casa e pais sejam subjugados às tiranias de crianças de 2 anos? Como entender que crianças de estatura "minimal" levantem a mão aos pais e imponham a sua força?

Não sei se conseguimos encontrar soluções e respostas "standard" para este problema que, de facto, afecta com um vigor crescente a forma como a sociedade se organiza e se pensa. Os pais estão realmente perdidos na ambiguidade que se criou em torno da fronteira entre disciplina e ausência desta. Os limites, ou a noção de limite está disturcida, os pais não reconhecem o que é esperado ou não que as crianças façam. A escola não sabe como dizer aos pais que os limites começam em casa e demite-se do seu papel, o papel de educadora.

Não se percebe onde, nem quando, mas, erradamente, passou-se a mensagem de que é errado frustar as nossas crianças, que o não é prejudicial ao seu desenvolvimento e, mais grave, que o choro é um fenómeno contra-natura. Os efeitos, ou consequências, do impacto que uma birra provoca numa familia são devastadores - pais desorientados, crianças a gritar e... birras satifeitas, crianças silenciadas até à próxima, até ao próximo "eu quero!".

É evidente que a estrutura familiar mudou, os filhos "exigem" os ténis de marca, os pais envolvidos nas suas tarefas laborais perdem o tempo de qualidade e esquecem-se da importancia dos momentos a sós com as crianças, dos momentos de partilha, da leitura de histórias, do brincar. Muitas vezes absorvidos por um sentimento de culpa, os pais acabam por comprar os seus filhos, sem se aperceberem que os juros serão altos, demasiados altos para que possam continuar a atenuar a sua culpa satisfazendo os caprichos das crianças.

Tudo isto origina uma falta de critérios na maneira como se educam as nossas crianças, existe um sistemático empurrar de responsabilidades entre as instituições educativas e a "instituição" familia. A escola atribui às familas a responsabilidade pelos "defeitos" dos seus novos utentes e as familias culpam as escolas pela incapacidade que estas têm em resolver e remendar os "defeitos" dos seus filhos. Neste jogo de ping-pong, quais jogadores chineses, as crianças continuam a pedir ajuda, a pedir que alguém ou alguma coisa os contenha, lhes mostre um mundo organizado e com rotinas, um mundo em que existe espaço para ser criança, para crescer dentro de limites e onde os valores, direitos e deveres surgem de forma estruturada pela naturalidade do seu desenvolvimento.

Como tive oportunidade de referir recentemente, privar as crianças de uma educução de qualidade nos mais diversos contextos educativos é expô-las a uma forma preversa de maus-tratos, permitindo que as crianças se desenvolvam em pequenos ditadores, adolescentes delinquentes e mais tarde adultos incapazes de resitir às contrariedade e frustações que a vida em sociedade acarreta. Privar as crianças de estratégias resilientes é torná-las em pequenos tiranos senhores das suas vidas e das vidas alheias.

Sabe-se que quanto mais precoces forem os comportamentos de oposição e desafio maior é a probabilidade do comportamento anti-social se tornar crónico. Na mesma lógica, quanto mais precoce for a intervenção, maior a probabilidade de prevenir esses comportamentos. É importante que se reconheça esta dificuldade que a sociedade tem em lidar com estas crianças e perceba que os problemas de indisciplina deixaram, há muito tempo, de ser exclusivos de ambientes sociais desfavorecidos e, que pelo contrário, assumem contornos preocupantes em toda a nossa sociedade.

Não é suficiente intervir no sentido de melhorar exclusivamente as competências das crianças, ou dos pais, ou dos educadores, é fundamental que todas os contextos se envolvam na resolução deste problema, procurando melhorar práticas e oferecer melhores respostas...

As crianças agradecem...

2 comentários:

Vanda disse...

Espero que tenhas tido uma boas páscoa também. Das mil e umas teorias sobre educar, falta, a meu ver tempo para educar, para ver crescer, para dar um exemplo; para se ter um exemplo para nos ajudar a crescer. Mesmo assim, uns seguem em frente e vencem, outros não. Não depende só dessa estrutura, mas também. E isso dava "pano para mangas"...

sotavento disse...

Li com atenção mas não tenho grande esperança!... :|