quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Depois das provas, a sequela...

Em Junho último tive oportunidade de escrever sobre a perversidade que as provas de aferição e exames nacionais podem oferecer antes, durante e depois da sua aplicação.
Pois bem, após a aplicação nacional das referidas provas, a verdade é que o impacto e o ruído em torno de cada uma delas é diferente e, naturalmente, oferece análises de natureza variada.
Se por um lado as provas de aferição podem efectivamente cumprir um papel importante na evolução dos conteúdos programáticos das áreas curriculares, sem que explicitamente esteja outra coisa em causa que não seja essa suposta "aferição" (sabemos que implicitamente o que está por trás das provas de aferição são análises de outro tipo, pouco ou nada interessantes para a evolução do nosso ensino básico), os exames do 9º e 12º implicam muito mais, implicam a aprovação ou não dos alunos e, consequentemente, o seu sucesso escolar. As primeiras são provas que "validam" a educação básica, enquanto as segundas condicionam, ou não, o acesso ao ensino superior para quem deseja prosseguir estudos.
A verdade é que a análise sistemática dos resultados de todas estas provas e coisas afins são, em certa medida (numa clara tentativa em ser optimista) deturpados e resvalam para uma espécie de avaliação da qualidade das instituições de ensino. Crença que é tão perigosa como errada, mas validada pela opinião pública.
Desta opinião generalizada e do "alarido" mediático que a comunicação social faz dos resultados, bem como da insistência, por parte do Ministério da Educação, em publicar as "estatísticas" do desempenho dos nossos alunos, nascem os "rankings".
Esta figura que anualmente invade os noticiários bem com os mais diversos órgãos de comunicação social não é mais do que uma tentativa de vender um produto, que neste caso é a Educação. Assim, os melhores classificados abanam a bandeira do mérito e das excelência enquanto os restantes apontam que os indicadores de uma escola de qualidade não podem ser medidos exclusivamente pelos resultados dos seus alunos nos exames (não podia estar mais de acordo, embora no ano seguinte, caso a situação se inverta, também a opinião mude).
Escusado será dizer que são inúmeras as questões de princípio que esta análise descuidada e fortuita dos "rankings" me oferece, mas a principal é a de estarmos, perigosamente a meu ver, "comercializar" um produto que deveria ser gratuito e de qualidade PARA TODOS.
Basta abrir os principais jornais para verificar o que as manchetes nos mostram...
Este tipo de informação destrói a nossa escola pública e faz passar a ideia errada que estas não têm tanta qualidade.
Não é verdade, o que estas têm são TODOS os alunos, sem EXCEPÇÃO, não há qualquer selecção prévia. Ora fazendo um exercício de lógica, facilmente percebemos que uma escola - a pública - que tem a obrigação e o dever de receber todos os alunos (todos os que se portam mal, todos os que têm dificuldades, todos os que vivem em condições de pobreza) como deve e tem de ser não pode ser comparada com as escolas que só recebem quem querem.
Mais me espanta ainda quando se verifica que algumas das escolas que só recebem quem querem se justificam pelos resultados "menos conseguidos" por terem um ou outro aluno com necessidades educativas especiais. Vejamos, quando a realidade é minimamente semelhante à da escola pública os resultados nos exames são piores? O que é que isto nos diz?
Os "rankings" só servem para criar um mercado na educação, uma cultura de privatização assente na ideia errada de que as escolas privadas são melhores do que as públicas. Os resultados até podem ser, mas não é necessariamente por quem lá trabalha é por quem deixam que lá estude...
Esta cultura de mercado que utiliza falsos argumentos, com base em falácias construídas através de comparações do incomparável é um ataque à escola pública e deve ser combatida. Subscrevo a proposta do colega Zé Morgado que defende a criação de um Observatório de Qualidade das Escolas, só assim poderemos olhar com rigor para o que se passa dentro das nossas escolas, só assim poderemos caminhar no sentido de uma escola pública gratuita de qualidade de todos e para todos.

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