domingo, 25 de outubro de 2009

Uma discussão antiga... uma leitura interessante.

Todos sabemos e reconhecemos que a actualidade da escola abarca TODOS os alunos, os "azuis", "laranjas", "roxos" e ainda os "salmão" (que é uma espécie de cor híbrida entre o laranja e o rosa). Pois bem, esta diversidade suscita emoções e sentires diversos que, inevitavelmente, nos levam às expectativas, maiores ou menores, consoante os casos específicos. Ora, se há matéria que a Psicologia estudou, aprofundou e ainda estuda e aprofunda, é o papel da expectativas na relação professor-aluno.
É impossível querer nivelar uma relação que é desnivelada por natureza, o professor é adulto, o aluno não, o professor tem mais poder e só aqui encontramos razão mais do que suficiente para compreender a assimetria de uma relação que não pode, nem deve partir do pressuposto de que alunos e professores se encontram aos mesmo nível nos direitos e deveres. São diferentes, assim como as suas tarefas e papeis. São diferentes, mas nada impede que definam o caminho em conjunto, trabalhando cooperativamente e no mesmo sentido, mas não façamos confusão não são pares.
Contudo, o facto de a relação ser assimétrica e de um ter de decidir em função do trabalho e desempenho do outro, não invalida que esta relação não se baseie no respeito. E este é um direito universal, o direito ao respeito na semelhança ou na diferença.
Ora, uma relação assimétrica, em que as coisas não correm bem, onde um tem mais poder do que o outro, pode, facilmente, resvalar para a falta de respeito, que, como uma bola de neve pequena no cimo de um cume, rapidamente se pode tornar numa avalanche...
Num almoço há já um bom par de anos, enquanto conversava com o amigo Sérgio Niza, ele disse-me algo parecido com o que vou reproduzir:
- Quando um animal feroz está assustado e se sente em perigo o que é que faz?
- ... (silêncio da minha parte)
- Ataca! - concluiu.
Depois disto tivemos uma interessante conversa sobre a importância da reciprocidade nas relações humanas e sobre o facto de, na maioria delas, o comportamento gerar comportamento em igual ou maior intensidade do que o primeiro (principio antigo que se mistura entre a psicologia e o senso comum).
O que me leva a recordar a experiência que tive com miúdos "dificeis" e o que a teoria me dizia quando a levava na mochila para trabalhar com os ditos miúdos.
- Existem miúdos que desatinam? Sim, muitos, todos os dias nas mais diversas escolas.
- Existem miúdos que só querem ir para a escola fazer disparates porque é o único sitio onde têm 1, 2, 3, ..., 30 minutos de antena? Sim, é a única forma que têm de se mostrar aos outros.
- Existem miúdos que nos faltam ao respeito? Sim, enquanto na resposta lhes continuarmos a validar o que eles pensam que sabem sobre nós.

Concordo com Laborinho Lúcio, a disciplina é um direito dos alunos, um direito que devem usufruir na sequência do respeito que nos merecem os seus gostos diferentes e "esquisitos", as suas modas, as suas necessidades e os seus interesses. A disciplina é a consequência de uma relação pedagógica de qualidade em que, olhos nos olhos, os alunos percebem que no aqui e agora não há espaço para a indiferença, não há necessidade de "desatinar" (porque há outras formas de se mostrarem, de se darem a conhecer), o que é há, é um adulto, numa relação assimétrica que os respeita, os valoriza e acolhe e que, no mínimo, espera e exige o mesmo deles. É o que é justo e isso eles conhecem e reconhecem bem...
O problema é o que respeito não se exige, mostra-se...
E é assim que se molda, que se suporta a aprendizagem e o desenvolvimento social, que se produz mudança e se dá a conhecer a utilidade de valorizar o outro, que se criam bases para "conhecer-mos o nosso limite interior" e refrearmos o ímpeto de agir, ou, como se diz em psicologia, o "acting out"...

sábado, 24 de outubro de 2009

Coisas que me arrepiam...

Este ano, já não me recordo exactamente quando, comprei uma caixa de Puccini, com as suas principais óperas (Turandot, Madame Butterfly, Tosca, La Bohème e Manon Lescaut).
O melhor da caixa é que nos trás o melhor de Puccini, com o melhor de Pavarotti, Freni, Sutherland, Caballé, Karajan, Levine e Mehta.
Ouvir esta caixa, nomeadamente a versão da Turandot é algo que considero extraordinário, pela intensidade, pela história, pela força, pela paixão, pelo turbilhão de emoções que emanam das vozes conjugadas nesta bela "sinfonia" que muito me diz...
Fica um cheirinho para ouvir até ao fim... mas que coro...


P.S. Esta versão é com o Plácido Domingo...

sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Inquietação... Inquietação...

Ao ler isto, só me ocorre um sentimento antigo...

Um sentimento que José Mário Branco cantou...



...e que mais tarde JP Simões reinterpretou!



quinta-feira, 22 de outubro de 2009

Leitura... Um hábito imprescindível

É mais ou menos consensual que o Plano Nacional de Leitura foi uma boa medida, útil para trazer a público a necessidade mudar os hábitos leitores dos portugueses.
Aparentemente, de acordo com um estudo que será hoje apresentado na 3ª Conferencia Internacional do Plano Nacional de Leitura na Fundação Calouste Gulbenkian, José Morais avança que falta hábitos intensivos de leitura às nossas crianças. Prática que o PNL procurou promover, tornando a leitura uma actividade mais mediática e apelativa aos jovens.
Os resultados que agora vêm a público mostram e comprovam aquilo que intuitivamente já se percebia no trabalho directo com os miúdos e com os professores. Os resultados obtidos não são totalmente conhecidos e é a maioria das pessoas desconhecem as metodologias e formas de recolha dos dados do estudo agora avançado. Naturalmente que esta discussão levar-nos-ia a uma análise mais fina de algumas das considerações avançadas, nomeadamente, no que está por trás dos "cerca de 40 testes, de leitura, compreensão e escrita adequados a cada ano.". Será que os 40 testes estão num nível de significância suficiente para que as crianças lhe atribuam significado e compreendam o que lhe é pedido nas diferentes provas?
Em Julho, tive oportunidade de participar na 16th European Conference on Reading, que teve lugar em Braga. A primeira sessão plenária ficou ao cargo do professor Jacques FIJALKOW, da Université de Toulouse-le-Mirail, com o título !Is it possible to efficiently teach reading and writing to all 5- to 7-year-old children?". A riqueza da comunicação, que traduziu anos de Investigação em França, com crianças apontadas como tendo dificuldades na aprendizagem na Leitura e Escrita, aponta algumas sugestões para aumentar os resultados dos alunos na leitura.
A que mais me encantou, pela sua simplicidade, são os momentos de leitura individual em que TODOS (incluindo o professor) lêem diarimamente durante 15 minutos na sala de aula um livro, um texto, uma noticia, algo significativo. Nota importante, TODOS, são mesmo TODOS, ou seja, o professor não aproveita para preencher sumários ou corrigir fichas, oferece-se como modelo... como os alunos, descobre a leitura e envolve-se na tarefa.
Isto de mandar os outros ler porque é bom... Só, não chega!

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Os benefícios da Ciência. A distância da prática.

Ao longo de todo o meu percurso, enquanto estudante e profissional da Psicologia e da Educação, houve uma frase que sempre me acompanhou desde o momento em que a ouvi: "A teoria é uma ferramenta que levamos às costas quando vamos para a prática.", by Zé Morgado que podem encontrar aqui.
É inevitável que assim seja, porque só assim conseguimos responder ao "aqui e agora" que o trabalho no terreno nos solicita permanentemente. Vivemos numa espécie de "learning by doing", mas a verdade é que o critério para a tomada de decisão tende a ser mais acertado quando o que está por trás dela é o conhecimento sustentado sobre uma determinada temática.
Feito este ponto prévio, gostaria de partilhar este artigo que li na Scientific American com o titulo: "Getting it Wrong: Surprising tips on How to Learn". O artigo apresenta vários estudos que indicam os benefícios do erro na aprendizagem e na recuperação da informação.
No fundo, o que os diversos estudos procuram evidenciar é que o erro não é algo a evitar, mas antes algo a valorizar na aprendizagem, porque facilita a compreensão e a significação dos conteúdos. Para quem acredita que a aprendizagem deve ser significativa e partir da pesquisa activa do conhecimento, há muito que defende esta perspectiva. Contudo, para quem acredita que evitar o erro é a melhor forma de fomentar a aprendizagem acredito que leitura deste texto possa ser um importante contributo para se ponderarem outras possibilidades.

terça-feira, 20 de outubro de 2009

Diversidade = Qualidade

Quando olhamos para os indicadores de qualidade que a massificação do ensino trouxe a Portugal, nomeadamente, na definição de políticas educativas que fomentavam a ideia de que TODOS os alunos tinham de efectuar o mesmo percurso educativo que deveria terminar no ingresso no ensino superior.
A verdade é que uma ideia cujo objectivo era proporcionar as mesmas oportunidades de acesso a uma educação melhor e mais qualificada, acabou por perverter o acesso a essa igualdade de oportunidades ao impossibilitar o respeito pela diferença e, mais grave, ao inviabilizar uma escolha livre de acordo com as motivações de cada um. Pretendeu-se ensinar a todos o mesmo, acreditando que assim se diminuía o fosso existente entre as classes sociais, garantindo uma melhor distribuição de oportunidades por todos.
Contudo, embora a intenção fosse boa, a verdade é que os resultados foram catastróficos levando a um aumento do abandono e do insucesso escolar. Não por que a escola fosse pior, mas porque para motivar e cativar (sim, como no principezinho) TODOS os alunos, a escola precisa de ter respostas diversificadas que vão ao encontro dos interesses e motivações dos alunos.
"Nem todos temos de ser doutores", disseram-me em tempos... Concordo!
O que temos é de apostar numa melhor qualificação dos nossos jovens, reconhecendo que a educação é, cada vez mais, ao longo de toda a vida e que a escolha de um caminho é poucas vezes irreversível, mas antes o inicio de um longo percurso.
Naturalmente isto levamos à discussão do que deve ser a Educação Básica, ou seja, qual o currículo essencial que todos os alunos devem aprender como base da sua formação cívica, científica, pedagógica e humana. Difícil...
Por isso, apenas me congratulo com uma boa noticia do Público: o número de alunos a frequentarem escolas profissionais aumentou em 10 mil alunos.
É verdade que este aumento é de louvar, mas continua a existir o preconceito de que quem escolha estes cursos são os alunos que têm "maus resultados" ou "pouco jeito para a escola", ou seja, existe uma conotação, altamente perversa, a este tipo de vias profissionalizantes a uma espécie de recurso ou 2ª via para os alunos que não cabem nos cursos de secundário.
O pensamento deve, a meu entender, residir no facto destes cursos possibilitarem uma escolha efectiva para quem tem um ideia clara do que pretende exercer e não, como José Morgado refere, serem encarados como um "alunão", ou seja, uma espécie de papelão para alunos com pouco espaço na via "mais escolar". Desta forma aumentamos efectivamente a qualificação dos nossos jovens, aumentando as competências profissionais da nossa comunidade.
Falta agora alargar esta oferta à generalidade das escola e acabar com o estigma social que estes cursos enfrentam, criando mecanismo de entrada no ensino superior, caso os alunos assim optem.

Um livro, uma parte da História


Assisti ontem ao lançamento do livro "A Escola Normal de Lisboa e a Formação de Professores - Arquivo, História e Memória", organizado por Joaquim Pintassilgo e Lurdes Serrazina. A sessão decorreu no anfiteatro da Escola Superior de Educação de Lisboa e contou com a presença de António Nóvoa e Fernando Serra.
Da sessão destacam-se vários apontamentos de interesse, mas destacaria aquele em que António Nóvoa problematiza e contextualiza os desafios que se colocam hoje em dia à educação. Uma ideia central da sua participação assentou no reconhecimento que o "ontem" em educação é sempre e incomparavelmente pior do que o hoje (ideia que tenho defendido) por ser, necessariamente, menos pensado, com menos recursos, com menos condições, com menos "saber ensinar". Contrariando assim os saudosistas da "exigência" e do "rigor", para que a escola de "ontem" era melhor, mais eficaz... A verdade é que a escola de "ontem" não era tão pública como é hoje e não o era porque não era para todos, logo, uma escola que não tinha TODOS os alunos não pode, evidentemente, ser comparada com a que temos hoje, onde estão, como devem, TODOS os alunos.
Introduziu aqui o desafio, ou seja, de que forma podem os professores responder à variabilidade garantido uma boa educação para todos. Aqui coloca a pedagogia no centro da problematização, questionando-se/nos de que forma poderemos voltar a introduzir o lugar da pedagogia na discussão sobre a formação de professores. Que saberes, que competências devem os futuros professores possuir para levarem a bom porto a sua tarefa? Onde acaba o conhecimento científico e começa o "saber ensinar", que relação, que equilíbrio procurar?

O Livro é um testemunho histórico do antigo Magistério Primário e assinala de forma muita clara alguns períodos marcantes da sua vida, nomeadamente a transição para a actual Escola Superior de Educação de Lisboa.
Um livro que só folheia, mas que me parece um importante depoimento para todos os que se interessam pela história da educação, pela história que começa na formação de quem vai ensinar.

sábado, 17 de outubro de 2009

Descobriram a pólvora...

Uma análise da escola em Portugal, seja através da sociologia da educação, seja através da recente Administração Escolar, ou ainda, recorrendo à História da Educação, mostra-nos que este é um bem público sujeito às mais diversas mudanças e desafios desde sempre. Nunca houve um período em que a escola pública e o sistema educativo português não estivessem sobre polémica ou análise. A memória é que é curta...
A nossa quase certa ex-ministra da educação vem hoje afirmar que os problemas actuais "não têm paralelo na história da educação".
Na mesma lógica do que referi recentemente sobre a perversidade dos "rankings" das escolas, Maria de Lurdes Rodrigues refere que o alargamento da escolaridade obrigatória ate ao 12 anos implica "ter consciência de quais são as consequências para as escolas e para o trabalho dos professores de estarem na escola, obrigatoriamente, todos os jovens até aos 18 anos”, acrescentando o fundamento da escola pública e um princípio essencial para uma escola de qualidade e inclusiva, ou seja, que as escolas têm de “acolher e integrar todos os jovens, sem excepção, com tudo o que isso significa em termos de heterogeneidade, condições, origens, motivações e expectativas em relação à escola”.
As palavras da Ministra da Educação continuam no mesmo sentido, referindo que “se aceitamos a escolaridade longa, precisamos de aceitar que todos podem aprender e ser ensinados, mesmo os que têm dificuldades ou menos motivação”. De seguida reforça o papel do Estado, que tem a obrigação, sustentou, de "garantir que a escola pública tem e terá todas as condições, todos os recursos humanos e profissionais, todos os recursos físicos e tecnológicos, todos os recursos organizacionais e de gestão para cumprir as metas que hoje lhe atribui”.
A noticia do público finaliza acrescentando que a nossa quase ex-ministra refere que “Não podemos desistir de nenhum dos nossos jovens. Nenhuma criança, adolescente ou jovem pode ser deixado para trás”.
A minha pergunta é, onde esteve esta base ideológica na apresentação do decreto-lei 3/2008 de 6 de Janeiro, ou na insistência absurda num modelo que avaliação de professores que ninguém percebeu e que só conduziu para uma maior fragmentação entre a sociedade civil e os professores e a escola? Onde é que esteve este discurso quando se define a publicação dos resultados das provas e se permitem análises tontas e desprovidas de qualquer rigor científico? Como, expliquem-me, é que é possível, que a mesma pessoa que defende que o estado tem de garantir uma educação de qualidade que responda às necessidades de TODOS os alunos, permite que se dificulte mais o acesso aos apoios especializados?
Não sei se estes serão os maiores e mais difíceis desafios a que a escola pública tem de responder, o que sei é que são os de agora, os de hoje e que comparações com o passado não nos ajudarão, porque estaremos a comparar o incomparável. A escola de há 10 anos não pode, necessariamente, ser a mesma que é hoje e os problemas de então não podem ser comparados com os de hoje, são outros, de natureza diferente e, certamente, com respostas diferentes.
Finalizo perguntando: onde esteve, nos últimos 4 anos, a ministra que ontem discursou? Onde esteve, nos últimos 4 anos, a ministra que permitiu que o secretário de estado decretasse o que decretou com claras reminiscências ideológicas do período em que se candidatou pelo CDS-PP a uma autarquia?

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

E se a política fosse um jogo de Xadrez.

São várias as analogias que se poderiam tecer entre a política e um jogo de Xadrez, desde a manipulação dos peões, dando-os "a comer" ao adversário, para não comprometer o objectivo final que é ganhar, passando pela visão estratégica que é necessária para ganhar uma partida de xadrez a um oponente que perceba, pelo menos, o mesmo que nós. Confesso que de xadrez sei muito pouco e que de política só de pensar...
Vejamos, quando estamos perante uma situação de impasse institucional, em que as várias peças do jogo estão comprometidas por uma campanha eleitoral que nada dignificou o debate político, onde tivemos homens e mulheres a gladiarem-se pela douta verdade reivindicando a exclusividade da patente, o resultado do panorama pós-eleitoral não pode ser animador. Acentuaram-se diferenças, cavaram-se fossos e, agravaram-se fissuras sem que se percebe claramente em que raio votou o eleitorado. Se nas propostas efectivas dos partidos, ou se no que os separa do ponto de vista da retórica e nas preferências pessoais que este ou aquele líder suscitam. Por exemplo, qual o impacto das propostas do CDS-PP na escolha que o eleitorado fez? Foram as propostas, ou o desagrado com as sucessivas polémicas que assombram o PSD nos últimos anos, agravadas pelo estranho silêncio de Belém e a ainda mais bizarra gestão do assessor no caso das escutas.
Qual a noção exacta que o eleitorado tem do que significa nacionalizar o sector energético e terminar com todos os benefícios fiscais, como propõe o BE? Foram nestas propostas que o eleitorado votou, ou no descontentamento com a altivez e arrogância de um governo que nunca quis nem soube dialogar?
Terá sigo esta dispersão de votos à direita e à esquerda uma forma de obrigar os partidos a entenderem-se no parlamento para que o país não corra o sério risco de paralisar durante a próxima legislatura?
A verdade é que ninguém poderá afirmar com certeza em que é que os portugueses votaram, porque a certeza das razões do seu voto cabe, exclusivamente, a cada um. Tudo o resto é especulação.
É com na base da especulação e na crença de que o eleitorado votou nas propostas e não nas quezílias pessoais e demagógicas em que a campanha se tornou, que os partidos fazem o jogo que lhes compete, afirmam a sua legitimidade para defenderem as posições e manterem o distanciamento face a uma atitude de compromisso, diálogo e tolerância perante propostas que contribuam para uma efectiva melhoria do país, independentemente do quadrante político de onde possam surgir... mais do que incompatibilidades ideológicas parecem ter-se agravado as incompatibilidades pessoais de egos tão distintos.
Foi aqui que o nosso primeiro ministro indigitado percebeu a oportunidade de aumentar o seu tempo de tolerância face aos momentos difíceis que se advinham no parlamento. Ao perceber que, genuinamente, nenhum partido poderia comprometer-se com uma coligação ou acordos parlamentares de caracter permanente, Sócrates, qual Kasparov, lança os peões que avassaladoramente todos os seus adversários partidos políticos "comeram". Estendeu a mão numa pergunta retórica para a qual já sabia a resposta... Se por um lado no espectro da direita há um não quase total, a esquerda teve uma maior abertura para possíveis entendimentos desde que respondam às necessidades económicas e sociais do país.
Só assim evitaremos que o país paralise, é necessário uma política responsável em que o pensamento dos deputados vá para além das suas "quintas" particulares e os interesses partidários, respondendo com verdade, mérito, ética e responsabilidade cívica ao papel para o qual foram eleitos, melhorar a qualidade de vida dos portuguesas.
E agora, que o jogo foi lançado e as peças coladas de forma clara em cima do tabuleiro, será preciso muito tempo para que a oposição possa de forma convincente argumentar que não tem responsabilidades perante o que vier a suceder. Ou não tivesse Sócrates dito: "Eu responderei pela pergunta que fiz, os partidos assumirão a responsabilidade da resposta que deram".
E é na resposta da esquerda que está uma pequena esperança de entendimentos pontuais, com propostas e políticas que "influenciem a governação" como Louça tem defendido e com "garantias claras de mudança" como espera Jerónimo.
Esperemos que no sentido certo...

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Depois das provas, a sequela...

Em Junho último tive oportunidade de escrever sobre a perversidade que as provas de aferição e exames nacionais podem oferecer antes, durante e depois da sua aplicação.
Pois bem, após a aplicação nacional das referidas provas, a verdade é que o impacto e o ruído em torno de cada uma delas é diferente e, naturalmente, oferece análises de natureza variada.
Se por um lado as provas de aferição podem efectivamente cumprir um papel importante na evolução dos conteúdos programáticos das áreas curriculares, sem que explicitamente esteja outra coisa em causa que não seja essa suposta "aferição" (sabemos que implicitamente o que está por trás das provas de aferição são análises de outro tipo, pouco ou nada interessantes para a evolução do nosso ensino básico), os exames do 9º e 12º implicam muito mais, implicam a aprovação ou não dos alunos e, consequentemente, o seu sucesso escolar. As primeiras são provas que "validam" a educação básica, enquanto as segundas condicionam, ou não, o acesso ao ensino superior para quem deseja prosseguir estudos.
A verdade é que a análise sistemática dos resultados de todas estas provas e coisas afins são, em certa medida (numa clara tentativa em ser optimista) deturpados e resvalam para uma espécie de avaliação da qualidade das instituições de ensino. Crença que é tão perigosa como errada, mas validada pela opinião pública.
Desta opinião generalizada e do "alarido" mediático que a comunicação social faz dos resultados, bem como da insistência, por parte do Ministério da Educação, em publicar as "estatísticas" do desempenho dos nossos alunos, nascem os "rankings".
Esta figura que anualmente invade os noticiários bem com os mais diversos órgãos de comunicação social não é mais do que uma tentativa de vender um produto, que neste caso é a Educação. Assim, os melhores classificados abanam a bandeira do mérito e das excelência enquanto os restantes apontam que os indicadores de uma escola de qualidade não podem ser medidos exclusivamente pelos resultados dos seus alunos nos exames (não podia estar mais de acordo, embora no ano seguinte, caso a situação se inverta, também a opinião mude).
Escusado será dizer que são inúmeras as questões de princípio que esta análise descuidada e fortuita dos "rankings" me oferece, mas a principal é a de estarmos, perigosamente a meu ver, "comercializar" um produto que deveria ser gratuito e de qualidade PARA TODOS.
Basta abrir os principais jornais para verificar o que as manchetes nos mostram...
Este tipo de informação destrói a nossa escola pública e faz passar a ideia errada que estas não têm tanta qualidade.
Não é verdade, o que estas têm são TODOS os alunos, sem EXCEPÇÃO, não há qualquer selecção prévia. Ora fazendo um exercício de lógica, facilmente percebemos que uma escola - a pública - que tem a obrigação e o dever de receber todos os alunos (todos os que se portam mal, todos os que têm dificuldades, todos os que vivem em condições de pobreza) como deve e tem de ser não pode ser comparada com as escolas que só recebem quem querem.
Mais me espanta ainda quando se verifica que algumas das escolas que só recebem quem querem se justificam pelos resultados "menos conseguidos" por terem um ou outro aluno com necessidades educativas especiais. Vejamos, quando a realidade é minimamente semelhante à da escola pública os resultados nos exames são piores? O que é que isto nos diz?
Os "rankings" só servem para criar um mercado na educação, uma cultura de privatização assente na ideia errada de que as escolas privadas são melhores do que as públicas. Os resultados até podem ser, mas não é necessariamente por quem lá trabalha é por quem deixam que lá estude...
Esta cultura de mercado que utiliza falsos argumentos, com base em falácias construídas através de comparações do incomparável é um ataque à escola pública e deve ser combatida. Subscrevo a proposta do colega Zé Morgado que defende a criação de um Observatório de Qualidade das Escolas, só assim poderemos olhar com rigor para o que se passa dentro das nossas escolas, só assim poderemos caminhar no sentido de uma escola pública gratuita de qualidade de todos e para todos.